terça-feira, 3 de maio de 2011

A poesia de Paulo César Pinheiro


Há muito tempo admiro o trabalho do carioca Paulo César Pinheiro como letrista e compositor. O início do sucesso de P.C. Pinheiro deu-se a partir da parceria estabelecida com o violonista Baden Powell em 1965, que ganhou vida na voz da inesquecível Elis Regina. A partir daí, vários nomes perfilaram-se ao seu: Tom Jobim, Edu Lobo, Toquinho, Dori Caymmi, Ivan Lins, João Nogueira e muitos outros. Com João Nogueira, de quem foi um grande amigo, Pinheiro compôs inúmeros sambas que foram imortalizados pela mineira Clara Nunes, com quem ele foi casado.

Aos poucos estou conhecendo o trabalho de P.C. Pinheiro na seara da poesia. Espero adquirir em breve algum livro seu. A julgar pela sua qualidade como compositor, Paulo César Pinheiro já pode ser considerado um dos grandes nomes da poesia brasileira contemporânea.


VIDÊNCIA

Eu vi uma velha, um velho e vi um menino.
E sobre as mãos e o colo da anciã
Eu vi a renda, a agulha, o bilro e a lã
Com que tecia as malhas do Destino.

Eu vi uma velha, e vi um menino e um velho.
E o quase cego olhar desse ancião
Tentava achar em nosso coração
Vestígio ao menos de seu Evangelho.

Eu vi um menino, um velho e vi uma velha.
E esse menino me arrastava a ela.
E a luz do velho se fechava em breus.

Chama-se Tempo esse menino forte.
E a costureira, pois, chama-se Morte.
E o velho cego, então, chama-se Deus.


PRAIA DO PORTO

Na praia do porto amanheço.
Na pedra do cais tomo assento.
Na água salgada eu me benzo.
No brilho do sol me oriento.

Na orla deserta eu caminho.
Na trilha de concha me enfeito.
No espelho de prata mergulho.
No pé da palmeira me deito.

No vento do mar me penteio.
No cheiro do sal me perfumo.
Na rede de palha balanço.
No azul do horizonte me aprumo.

Na estrela da tarde te chamo.
Na ponte de tábuas te vejo.
Num vão de maré te contemplo.
Na luz do luar te desejo.

No branco da espuma te encontro.
Na areia do chão te desenho.
No ronco das ondas te encanto.
No sangue da aurora te tenho.

No corpo moreno eu me esvaio.
Na arrebentação me energizo.
Na vela do barco adormeço.
No canto do mar me eternizo.


A GRANDE VIAGEM

O mar tem muito mistério,
A vida muito segredo.
O mar às vezes assusta,
A vida às vezes dá medo.

A gente é só marinheiro,
A vida é como oceano.
No mar tem barco-fantasma,
Na vida tem desengano.

O mar é pura aventura,
A vida é a grande viagem.
Por isso o mar tem quimera
E tem a vida miragem.

O mar é estrada comprida,
A vida é um barco no mar.
O mar vai dar em que vida?
E a vida onde é que vai dar?

O primeiro poema foi extraído do livro "Viola Morena", Edições Tempo Brasileiro. Já o segundo e o terceiro pertencem ao livro "Clave de Sal", Editora Griphus. Recolhidos dos sites Releituras e Sopa de Poesia.

Roda de samba em homangem a Paulo César Pinheiro

2 comentários:

Fábio Martins Faria disse...

Caro Glauber
gostei desse Quintal...
passarei poraqui outras vezes para tomar café com prosa...
Abraço forte,
Fabio

Lelê disse...

o primeiro poema foi musicado por Sérgio Santos e está em um precioso disco chamado Rimanceiro.

Em número de canções, é o compositor com o maior número de obras em parceria com Paulo César Pinheiro! Vale muito apena ouvi-las ;)

abraços!

Letícia