Um dia recebi o título de poeta.
Guardei-o, pequeno relicário
incandescente que por tempos
contemplei no quarto escuro da alma.
Hoje, para o bem da poesia,
dele abdico.
Não fugirei como Rimbaud, que
partiu aos vinte e poucos para o
norte da África numa viagem
sem volta.
Não serei um mercador de armas
como o jovem poeta francês.
Quando muito, venderei lembranças
num antiquário de peças sem valor.
Tudo tende à dissipação dentro
da manhã nublada.
Os sentimentos aninhados nos
quadrantes da memória se diluem
no emaranhado de sinapses.
O que restará de matéria poética,
dessarte?
Talvez o voo cego de um pássaro
em extinção,
ou ainda o brilho no olhar da moça
sorridente, fossilizado na revista
dominical.
Doravante, as indagações tornaram-se
irrelevantes.
Silente, com dois olhos que queimam,
serei apenas mais um espectador
dos mistérios da vida e seu poder
de transformação.
* * *
Goiânia, 03 de março de 2011
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