Pular para o conteúdo principal

FIJI

 


Fiji não era apenas um arquipélago distante. Era uma promessa, uma imagem esculpida em tons de azul e branco que se formava na mente como um oásis inalcançável. Falava-se de suas praias onde o tempo parecia suspenso, de ilhas dispersas como jóias no oceano, de um mar que refletia o céu como se o carregasse no colo. Era o retrato ideal para algo que nunca aconteceu.

Penso em nós, ou no que poderíamos ter sido, como quem observa a linha do horizonte, sabendo que ela jamais se aproxima. Havia promessas nos dias que passamos juntos, mas eram como castelos de areia — firmes por um instante, mas destinadas às marés. Falamos tantas vezes de viagens que nunca fizemos. Imagino você com os pés afundados na areia quente, o sol brincando nos seus cabelos enquanto eu buscava palavras para prender aquele instante. Mas as palavras nunca vieram, e nem a viagem.

Uma vez, desenhamos um barco num guardanapo de papel. Você riu, dizendo que ele jamais flutuaria. Ainda assim, dobramos o papel com cuidado, como se o desenho pudesse, de alguma forma, nos levar para longe. Acho que confiávamos que o destino seria mais generoso que nossos passos. Mas o barco ficou no guardanapo, e nós ficamos à deriva.

As memórias, quando voltam, trazem o cheiro da maresia. Elas carregam imagens de coisas que não vivi, mas que sinto como se tivessem sido reais: nós correndo pela areia, uma rede balançando entre palmeiras, o som distante de um violão. Momentos que poderiam ter sido nossos, mas que agora pertencem ao reino do imaginário. Há uma beleza melancólica nisso, como encarar um mapa e saber que nunca se pisará naquele solo.

O tempo é cruel com o que não se realiza. Ele rouba as cores, apaga os detalhes, mas deixa o contorno. Fiji, para mim, é isso: o esboço de um sonho, uma promessa que jamais atravessou o oceano. Talvez seja melhor assim.

Dizem que o amor eterno é aquele que não se completa. Talvez o que tivemos — ou o que quase tivemos — seja isso: um barco que nunca partiu, mas que ainda flutua na memória. Fiji continua lá, inalcançável e perfeita, como tudo aquilo que nunca foi tocado. E, de alguma forma, isso basta.

* * *

Gurupi-TO, 20 jan 2025

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A saudade de Manoel de Barros

Ausente entre nós desde 13 de novembro de 2014, é inegável a falta que o poeta matogrossense Manoel de Barros nos faz. Em tempos de aspereza cada vez mais exacerbada, a ausência da sua candura e o seu olhar onírico sobre a vida faz desse mundo um lugar mais pálido, menos interessante.  A seguir, alguns poemas de Manoel de Barros, para que possamos recobrar a inocência outrora perdida. O apanhador de desperdícios Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão tipo água pedra sapo. Entendo bem o sotaque das águas Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes. Prezo insetos mais que aviões. Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos mísseis. Tenho em mim um atraso de nascença. Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz por isso. Meu quintal é maior do que o mundo. Sou um apanhador de des...

Bud Spencer & Terence Hill

Se havia algo capaz de me deixar extremamente feliz nos meus anos de infância e adolescência, certamente era quando os reclames do plim-plim anunciavam algum filme da dupla Bud Spencer e Terence Hill na Sessão da Tarde. Era diversão garantida, principalmente pelas atuações formidáveis de Spencer, com seu jeito mal humorado e seus socos potentes, que não raro levavam a nocaute vários adversários de uma só vez. Somente há pouco tempo (Deus salve a Wikipédia) descobri que os dois atores são italianos. Bud Spencer na verdade se chama Carlo Vicente Pedersoli, (Nápoles, 31 de outubro de 1929), e para minha grata surpresa foi um grande nadador, tendo participados das Olimpíadas de 1952, 1956 e 1960. Já Terence Hill, o galã da dupla, atende pelo nome de Mario José Girotti, e nasceu em Veneza no dia 29 de março de 1939. Não sei relacionar o nome dos filmes, porque o que importava para mim era a pancadaria rolando solta. Vale a pena rir um pouco com esses caras. Dois tiras fora de ordem - cen...

Esses chopes dourados

Verdes bandejas de ágata, meus olhos amarelos   caminham para mim pela milésima vez   enquanto estou cercado por brancos azulejos   e amparado por uma toalha de quadros.   No útero deste bar vou me elevando   e saio da noite cheia de ruídos   para a manhã do mar   onde tudo é sal, impossível alquimia   disfarçada num domingo Amável,   esta manhã me aturde, manhã de equívocos   onde um sábado moribundo se entrega sem rancor.   Meu sábado, belíssima ave negra de olho aceso,    cai nas muralhas do sol como um herói melancólico   enquanto o mar abre o sorriso de dentes brancos   lavados na areia alvura.   Caminho para o sol que me atrai mecanicamente:                      ...