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Mostrando postagens de janeiro, 2011

Nauro Machado

Exegi monumentum aere perennius  ( Erigi um monumento mais eterno que o bronze - Horácio) "Ocupo um espaço que não é meu, mas do universo" "O mundo restará o mesmo sem minha quota de angústia e sem minha parcela de nada" (Nauro Machado) Nauro Machado, poeta maranhense, um gigante desconhecido. Autor de técnica refinada, autodidata, a um só tempo alia a produção em larga escala com a qualidade poética que lhe é peculiar. Mestre dos sonetos - vide a antologia Nau de Urano, lançada em 2002, que comporta mais de 800 poemas redigidos nesta forma. Não há na poesia brasileira atual quem lhe faça frente na confecção de sonetos. Com mais de cinquenta anos de carreira, Nauro tem em seu currículo cerca de 30 livros de pura poesia. Sobre Nauro: É difícil qualificar esses poemas escritos, por assim dizer, no avesso da linguagem. Não é pela compreensão lógica que eles nos atingem, mas pelo sortilégio de um falar desconcertante e único. (Ferreira Gullar) Não hes...

Composição

Não é somente da rosa-flor Perfume-rosa, rosa augusta de Perfilados dentes alvos Que se colhem palavras para a Composição do poema (palavras densas de açúcar como o são as passas estragadas; palavra-confeito que se desfaz na boca, espraiando-se pelas glândulas salivares) Reter a paisagem, descobrir O vocábulo entranhado no coração Dos monturos, a palavra inservível Presa de si mesma Verbo em decomposição, destilando Odores de metano Esperar a noite, o cair da noite O desenlaço de suas pétalas noturnas E das sombras ver surgir Seu tropel de criaturas segregadas Vinde palavras prostitutas, ébrias, Indigentes, viciadas de toda espécie Escutai o bater de asas, um anjo Por ti está em vigília Ainda que um anjo coxo Espécie de Quasímodo alado Adentrai vossa casa, não temeis Mesmo que edificada sobre o Moralismo movediço de tratados E convenções Repousai na face virgem e alcalina Do papel Inaugurai nesta nova pátria inominada Sob o estatuto do mencionado i...

O mistério da mulher

foto de Henri Cartier-Bresson Rua Cuauhtemoctzin, Cidade do México   "O mistério da mulher está em cada afirmação ou abstinência, na malícia das plausíveis revelações, no suborno das silenciosas palavras"   (Henriqueta Lisboa, poeta mineira)

Chega de saudade

Chega de Saudade , de João Gilberto: marco inicial da Bossa Nova reencontro entre Tom Jobim e João Gilberto após 30 anos

Quintanares

Já que falamos em saudade... Presença É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas, teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento das horas ponha um frêmito em teus cabelos... É preciso que a tua ausência trescale sutilmente, no ar, a trevo machucado, a folhas de alecrim desde há muito guardadas não se sabe por quem nalgum móvel antigo... Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela e respirar-te, azul e luminosa, no ar. É preciso a saudade para eu sentir como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida... Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista que nunca te pareces com o teu retrato... E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te!           (Mario Quintana)

30 de janeiro - Dia da saudade

Dia da Saudade No dia 30 de janeiro comemora-se o dia da saudade. Segundo os linguistas, a palavra saudade deriva do latim solitatis (solidão). Mas esta não é a verdadeira acepção do vocábulo, não como a conhecemos e experimentamos no dia-a-dia. Sentir saudades é inerente à condição humana. Diante dela, temos a consciência da nossa limitação, pois ela nos mostra que somos incapazes de abarcar e reter as emoções que permeiam nossas vidas.   Assim, não podemos prender ao nosso lado a existência das pessoas queridas, que mais cedo ou mais tarde partem para outro lugar, seja nesta ou noutra dimensão; também nos é impossível eternizar os momentos de gozo, pois atrelada aos braços do tempo, com palavras cruéis a saudade nos diz que somos efêmeros. Por fim, chegamos à dura conclusão de que a saudade é imortal. Matar a saudade não significa aniquilá-la para sempre. Quando muito, satisfazemos momentaneamente as lembranças que nos invadem o peito, seja olhando uma velha fotografia, seja ...

Jorge Ben e Tim Maia - 1981

Encontro antológico dessas duas legendas da música brasileira, representantes maiores da nossa black music . Juntos, cantando a música Lorraine , de Jorge Ben. Firmeza!

O negro fala sobre rios

James Langston Hughes Conheço rios: Conheço rios tão antigos quanto o mundo e mais           [ velhos que o fluxo de sangue humano           [ nas veias humanas. Minha alma se tornou profunda como os rios. Banhei-me no Eufrates quando eram jovens as                                                    [ auroras. Construí minha cabana junto ao Congo e ele                           [ me cantou canções de ninar. Olhei para o Nilo e acima dele levantei as          ...

Buena Vista Social Club

Tudo começou no ano de 1996, quando o músico e produtor norte-americano Ry Cooder viajou para Cuba, onde gravou um disco com a participação de vários músicos cubanos, em sua grande maioria velhos artistas já caídos no esquecimento. Em 1998 o diretor de cinema Wim Wenders, amigo de Cooder, acompanhou este em nova viagem à Cuba, onde gravaria um disco solo de um desses artistas, o cantor Ibrahim Ferrer, considerado uma espécie de Nat King Cole cubano. Wenders não perdeu tempo e registrou a velha guarda cubana em ação. Assim, o mundo pode conhecer o talento desses verdadeiros gênios da música, como Ibrahim Ferrer, o compositor e cantor Compay Segundo, os violonistas Eliades Ochoa e Barbarito Torres, a encantadora cantora Omara Portundo e o carismático pianista Rubén González, entre tantos outros. Com a ditadura castrista, esses artistas foram obrigados a abandonar a arte em busca da sobrevivência. Ibrahim Ferrer, por exemplo, trabalhava como engraxate nas ruas de Havana. Uma das pa...

AS TRÊS PALAVRAS MAIS ESTRANHAS

Quando pronuncio a palavra Futuro a primeira sílaba já pertence ao passado. Quando pronuncio a palavra Silêncio, destruo-o. Quando pronuncio a palavra Nada, crio algo que não cabe em nenhum não-ser. (Wislawa Szymborska) Conheça mais sobre a autora clicando AQUI !

Concert for George

  Em 29 de novembro de 2002 foi realizado em Londres, na tradicional sala de espetáculos Royal Albert Hall, um concerto beneficente reunindo grandes nomes da música mundial em memória ao beatle George Harrison, que falecera exatamente um ano antes do concerto.   Entre os presentes, os ex-beatles Paul McCartney e Ringo Starr, o músico indiano Ravi Shankar, o guitarrista Eric Clapton, o músico Billy Preston, também já falecido, além do filho único de George, Dhani Harrison, cuja semelhança física com o pai é impressionante. Durante o espetáculo, foram interpretadas canções de autoria de George Harrison, compostas tanto no período dos Beatles quanto durante sua carreira solo. Muito ligado à espiritualidade, George Harrison, o beatle tímido e introspectivo, conseguia transmitir através de suas músicas um sentimento de quietude e ternura. Nada como escutar suas canções reconfortantes em tempos difícieis e áridos como os de hoje.   Something - interpretada por Paul McCartney...

Crazy Heart

Jeff Bridges é um desses raros atores capazes de dar vida a um personagem a tal ponto de se tornar impossível enxergar a fronteira que separa o papel do ator. Em Crazy Heart (Coração Louco), Bridges é Bad Blake, um cantor de música country outrora famoso, mas hoje decadente, solitário e afundado no vício do álcool. Com sua velha camionete, Bad Blake percorre o interior do país levando sua música para fãs cada vez mais raros, tocando em palcos decadentes e melancólicos. Todavia, Bad Blake não é uma figura que inspira pena. Ao contrário, ele é um símbolo de resistência ao mercado milionário da música country americana. Empunhando sua rebeldia e abraçado a uma garrafa de uísque, Blake nos mostra que um verdadeiro artista é aquele que acredita na essência da sua arte, esta sim, sem preço estipulável. Uma bela película.   Música Hold on you, na voz de Bad Blake (Jeff Bridges)

O pavão - crônica de Rubem Braga

Eu considerei a glória de um pavão ostentando o esplendor de suas cores; é um luxo imperial. Mas andei lendo livros, e descobri que aquelas cores todas não existem na pena do pavão. Não há pigmentos. O que há são minúsculas bolhas d'água em que a luz se fragmenta, como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas. Eu considerei que este é o luxo do grande artista, atingir o máximo de matizes com o mínimo de elementos. De água e luz ele faz seu esplendor; seu grande mistério é a simplicidade. Considerei, por fim, que assim é o amor, oh! minha amada; de tudo que ele suscita e esplende e estremece e delira em mim existem apenas meus olhos recebendo a luz de teu olhar. Ele me cobre de glórias e me faz magnífico.   Rio, novembro, 1958

Extinção

Indiferença

"A indiferença nada mais é que a incapacidade de perceber as diferenças. É um estado anormal, no qual perde a nitidez a fronteira entre a luz e a escuridão, a alvorada e o crepúsculo, o crime e o castigo, a crueldade e a compaixão, o talento e a mediocridade. Assim é a indiferença!" (Elie Wiesel)

Drummondianas

Em face dos últimos acontecimentos Oh! sejamos pornográficos (docemente pornográficos). Por que seremos mais castos que o nosso avô português? Oh! sejamos navegantes, bandeirantes e guerreiros sejamos tudo que quiserem, sobretudo pornográficos.   A tarde pode ser triste e as mulheres podem doer como dói um soco no olho (pornográficos, pornográficos). Teus amigos estão sorrindo de tua última resolução. Pensavam que o suicídio fosse a última resolução. Não compreendem, coitados, que o melhor é ser pornográfico. Propõe isso ao teu vizinho, ao condutor do teu bonde, a todas as criaturas que são inúteis e existem, propõe ao homem de óculos e à mulher da trouxa de roupa.   Dize a todos: Meus irmãos, não quereis ser pornográficos? Carlos Drummond de Andrade

Quintal das lembranças

  João Nogueira - Carioca, suburbano, mulato e malandro É bem verdade que o nome de João Nogueira voltou à mídia graças ao desempenho do seu filho, o talentoso cantor e compositor Diogo Nogueira. Mas justiça seja feita. João Nogueira é um dos grandes nomes do samba brasileiro, mentor do chamado “samba de calçada”, de caráter nitidamente suburbano, retrato da periferia e da velha malandragem carioca. João Nogueira teve em Paulo César Pinheiro o grande parceiro de letras. Já a voz principal, responsável por propagar as composições de João e PC Pinheiro foi a da imortal Clara Nunes. Com um trio desses, é impossível imaginar que João Nogueira não tenha seu nome marcado na história da música brasileira. Saravá, João Nogueira! Mineira - música feita em homenagem a Clara Nunes. Ao fundo, um jovem Raphael Rabello no violão.   Espelho - música de João Nogueira e PC Pinheiro  Diogo Nogueira - Além do espelho

Garimpos

  GARIMPOS na tênue superfície do cotidiano fragmentos banais se revelam: o copo quebrado que numa noite profunda matou a sede do velho pescador cartas que um dia pediram notícias ou que apenas trouxeram a saudade de quem há muito partira o sorriso da jovem em seu vestido branco de primeira comunhão o espelho da toalete onde anos a fio o pai viu-se endireitando a gravata antes de sair para o trabalho assim caminhamos pela vida a bordo de naus cegas em pleno nevoeiro gravando no mundo nossas cicatrizes e quando não mais vagarem pelas ruas as sombras errantes dos nossos feitos e de nós se esquecerem todos os adeuses surgirá alguém a vasculhar por entre as fendas congeladas do passado o cemitério de antigas lembranças * * * Goiânia, maio 2008

Quintal das lembranças

Maestro Tom Jobim – 84 anos Hoje, caso vivo estivesse, o maestro Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim completaria 84 anos. O “Tom do Vinicius”, como era chamado no início da carreira, antes de consagrar-se, em referência ao parceiro eterno Vinicius de Moraes, já bastante conhecido naquela época. Como não era famoso, ao tratar com produtores e outras pessoas do meio musical, sempre era questionado sobre sua identidade. “Mas quem é você mesmo?” – perguntavam. “Eu sou o maestro Tom Jobim, o Tom do Vinicius!”. Mas logo o maestro conquistou não só o país, mas o mundo com sua música. É verdade que Tom Jobim desejava mesmo era ser um compositor clássico, assim como o seu maior influenciador, o maestro Heitor Villa-Lobos. Nesse particular, Tom Jobim foi um compositor mediano. Mas foi com a música dita popular que ele se tornou um dos maiores do mundo, escrevendo, sobretudo com o parceiro Vinicius de Moraes, aquele que é considerado o mais importante capítulo da música brasile...

João do Vale - um artista do povo

Já havia escrito aqui sobre João do Vale há algum tempo ( Quintal das lembranças - parte IV ). Minha intenção agora é ressuscitar uma crônica que escrevi a seu respeito, intitulada "O carcará encantado", a seguir reproduzida. O carcará encantado Numa dessas manhãs nubladas em que a vida se enche de saudosismo, fui tomado pelas memórias do meu tempo como estagiário de direito, em especial aquelas dos dias em que a instituição na qual servia entrou em greve. Na ocasião, por determinação da chefia superior, ao menos um dos estagiários deveria ficar de plantão em cada turno, a fim de atender algum caso urgente que viesse a aparecer. Dentre as pessoas que laboravam na repartição, guardo ainda viva a lembrança da faxineira que diariamente limpava o lugar, de nome Andréia, que a todos cativava com seu jeito simples e espontâneo. Não me recordo, porém, se ela alguma vez chegou a pronunciar meu nome, pois usualmente tratava a todos pelo epíteto “irmão”. O fato é que a “irmã” Andréia e...

Apenas um rapaz latino americano

Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes decretou exílio por vontade própria. Ou talvez não. Talvez a grande mídia tenha tratado de exilar esse grande artista justamente por considerá-lo hermético e, consequentemente, "não popular". Não sei dizer se Belchior já retornou do Uruguai, onde trabalhava na tradução da sua obra para a língua espanhola. O fato é que há uma deficiência cultural a ser suprida urgentemente em nosso país, e Belchior ainda é um dos poucos artistas capazes de resgatar-nos da pobreza que vivenciamos. "Eu não estou interessado em nenhuma teoria, Em nenhuma fantasia, nem no algo mais Nem em tinta pro meu rosto ou oba oba, ou melodia Para acompanhar bocejos, sonhos matinais Eu não estou interessado em nenhuma teoria, Nem nessas coisas do oriente, romances astrais A minha alucinação é suportar o dia-a-dia, E meu delírio é a experiência com coisas reais" (trecho da música Alucinação )

Quintal das lembranças

Dorival Caymmi e Renato Russo Tão belo quanto inusitado foi este encontro entre o monumental Dorival Caymmi e o genial Renato Russo, promovido pelo programa "Por acaso", da Band. O ano do evento, conforme informação contida no vídeo, seria 1994. Vale a pena conferir o dueto interpretando a canção "Só louco", de Dorival Caymmi.

Quintal das lembranças

Baden Powell de Aquino "O violão é minha metade" Baden Powell em Paris

Travessia das horas

O dia ao largo, com suas raias estendidas Sobre a superfície da manhã O sol do oriente se espraia pelo espelho Das águas, quase cego vislumbro Um agitar de folhas, zéfiro que sopra Do oeste, convite para íntimas navegações Vida em suspeição Como antigos cristais balouçando No limiar da navalha Braços alados, abarco as dimensões Aquáticas, o coração a fremir em Arroubos espasmódicos Maldição de quem não se afez Às turbulências marinhas E no fim de tudo Atravessam-se manhãs, primaveras, decênios A cidade extinta e seus jardins submersos Presente para futuros arqueólogos